Charlotte Perriand – Foto: Divulgação
Arquitetando espaços pautados em funcionalidade e inovação, Charlotte Perriand foi — e ainda é — uma mulher à frente de seu tempo. Além da icônica parceria com Le Corbusier, a designer moldou, por si só, uma estética que hoje volta a ocupar os holofotes do design contemporâneo e causa suspiros entre os fashionistas.
Nascida na capital francesa em 1903, Perriand cresceu num cenário de efervescência artística e revolução industrial. Desde jovem, rejeitou os ornamentos da Belle Époque e mirou no que lhe parecia mais inovador: a funcionalidade. Aos 24 anos sua carreira deu uma guinada quando se candidatou para trabalhar no ateliê de Le Corbusier, sendo inicialmente recusada com a dura frase “aqui não bordamos almofadas”.
Isso porque, na época, a designer estudava na Union Centrale des Arts Décoratifs, ocupada majoritariamente por mulheres que possuíam um ateliê de bordados no currículo. Mas foi após visitar sua exposição Bar sous le toit, no Salon d’Automne, que o arquiteto franco-suíço reconheceu o trabalho da jovem designer e a convidou para fazer parte de sua equipe.
O trio formado por Perriand, Le Corbusier e Pierre Jeanneret — arquiteto primo de Corbusier — revolucionou o mobiliário das décadas de 1920 e 1930, criando peças que refletiam a essência do modernismo. Com a evolução das máquinas fervendo, a designer se inspirou nas ideias da indústria e mirou em trabalhos que dialogassem com a funcionalidade extrema. Foi nessa época que o trio concebeu a conhecida Chaise Longue Basculante (LC4), poltrona desenhada ao redor do corpo humano para garantir ainda mais conforto, hoje presente em acervos de museus como o Centre Pompidou e The Metropolitan Museum of Art.

Perriand na “Chaise Longue Basculante” – Foto: Divulgação/Acervo
Em 1937, Perriand abandona a parceria com os dois arquitetos e foca em projetos pessoais, estudando sobre modularidade, materiais tradicionais e formas orgânicas. Durante a Segunda Guerra Mundial, passou períodos no Japão e Vietnã, onde aprofundou sua conexão com o artesanato e a estética oriental. Ativa politicamente, produziu também frisos para o Front Populaire, denunciando regimes ditatoriais e as negligências causadas por estes.
Décadas após sua morte, em 1999, Charlotte Perriand foi “redescoberta” pelo mundo — finalmente recebendo o reconhecimento que foi, por muito tempo, atribuído aos homens com quem trabalhou.
Em 2013, a Louis Vuitton construiu uma réplica de La Maison au Bord de l’Eau — uma casa de praia projetada pela designer em 1934 e apresentada em Miami Beach durante a semana de design da cidade. Em 2019, a marca reforçou o tom deste resgate com a exposição Charlotte Perriand: Inventing a New World, realizada na Fondation Louis Vuitton em Paris. A mostra, que apresentou mais de 200 obras de Perriand, celebrava a estética e o impacto político-social de seus trabalhos.
Na Milan Design Week de 2025, a Louis Vuitton fez uma nova homenagem e remontou a La Maison au Bord de l’Eau no Palazzo Serbelloni, apresentando também uma coleção inédita de têxteis, que revisita padrões gráficos desenvolvidos por ela nos anos 1930. Um dos destaques é o motivo de montanha que decorava a banqueta de seu primeiro apartamento na Place Saint-Sulpice, em Paris, agora reinterpretado em nova escala e composição cromática.
Paralelamente, a Saint Laurent consagrou o revival com uma edição inédita de quatro peças de mobiliário desenhadas por Perriand, entre 1943 e 1967, cuidadosamente resgatadas de seus arquivos. Projetado para a residência do embaixador do Japão em Paris, um sofá de sete metros ganha vida. A peça, encomendada pelo arquiteto Junzô Takakura, exemplifica bem o talento de Perriand: apesar de longa e pesada, possui uma silhueta aerodinâmica que parece flutuar.

Banco para a residência do embaixador do Japão em Paris – Foto: Divulgação/Saint Laurent
Também durante a Milan Design Week deste ano, a Cassina criou um universo lúdico e dramático para apresentar novas versões da poltrona LC1. Projetada em 1928 por Le Corbusier, Jeanneret e Perriand, é considerada uma peça seminal do design moderno e foi apresentada ao público pela primeira vez em 1929, no Salão de Outono de Paris.