Foto: Reprodução/Instagram/@_anamariagoncalves
A escritora Ana Maria Gonçalves acaba de entrar para a história ao ser eleita para a Academia Brasileira de Letras (ABL), ocupando a cadeira número 33, anteriormente pertencente ao filólogo Evanildo Bechara. Com a eleição, Ana Maria se torna a primeira mulher negra a integrar a tradicional instituição fundada em 1897, que hoje reúne nomes como Fernanda Montenegro e Gilberto Gil.
Autora do premiado romance “Um Defeito de Cor (2006)”, ganhador do Prêmio Casa de Las Américas (Cuba, 2007) e considerado o maior romance do século, Gonçalves é uma das vozes literárias mais potentes da atualidade.
Em 2024, a obra inspirou o enredo da escola de samba Portela, que conquistou o Estandarte de Ouro, recebeu nota máxima no samba-enredo e brilhou no Desfile das Campeãs. O sucesso no carnaval impulsionou ainda mais o livro, destacando-o entre os mais vendidos do país, com edições esgotadas.
Além de atravessar o carnaval e o mercado editorial, “Um Defeito de Cor” também foi levado para o universo das artes visuais. Ana Maria Gonçalves é co-curadora da exposição “Um Defeito de Cor”, eleita a Melhor Exposição de 2022, que já passou pelo Rio de Janeiro, Salvador e, em abril de 2024, estreou em São Paulo, no Sesc Pinheiros. O romance ganhou forma no espaço expositivo do segundo andar do Sesc Pinheiros, em São Paulo, com uma mostra que extrapola as páginas do livro e propõe uma imersão sensorial e simbólica em sua narrativa. A exposição, que já passou pelo Rio de Janeiro e Salvador, é fruto de uma curadoria colaborativa entre Ana Maria Gonçalves, Amanda Bonan e Marcelo Campos (ambos do Museu de Arte do Rio), e reúne obras de 131 artistas, entre nomes consagrados e contemporâneos, como Kwaku Ananse Kintê, Kika Carvalho, Antonio Oloxedê e Goya Lopes.
A obra, já considerada uma das mais relevantes da literatura contemporânea brasileira, reconstrói a história de Kehinde, uma mulher africana trazida ao Brasil como escravizada, em uma saga que atravessa séculos, continentes e diversas camadas da identidade afro-brasileira. Com uma escrita densa, histórica e poética, Ana Maria dá forma à memória, à resistência e à complexidade de uma experiência marcada pela diáspora e pelo racismo estrutural.
Natural de Ibiá, no interior de Minas Gerais, Ana Maria trabalhou como publicitária em São Paulo antes de deixar tudo para trás, em 2002, e se mudar para Itaparica com o desejo de se dedicar integralmente à literatura. Seu primeiro romance, “Ao lado e à margem do que sentes por mim”, foi publicado de forma independente e vendido quase inteiramente pela internet — um feito raro para a época. Mas foi com “Um Defeito de Cor”, seu segundo livro, que Ana Maria entrou definitivamente para o cânone da literatura brasileira.
A obra levou cinco anos para ser concluída, incluindo dois anos de pesquisa intensa, um ano de escrita e outros dois de reescrita minuciosa. Com sólida atuação no Brasil e no exterior, foi escritora residente em instituições como Tulane, Stanford e Middlebury, nos EUA a autora ganha destaque nacional e internacional com os debates raciais no campo da literatura.
Sua entrada na ABL representa não apenas um marco pessoal, mas também um gesto simbólico de reparação histórica e ampliação da representatividade dentro da literatura brasileira.